René Descartes e o Discurso do Método, Parte 2 de 2

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Descartes começou aplicando o método sobre a álgebra e a geometria como forma de demonstrar para si o funcionamento do mesmo e se aperfeiçoar em seu uso. Após esgotar as incursões sobre a matemática, que resultaram naquilo que conhecemos como Geometria Analítica e o plano cartesiano, ele passou para o seu real objetivo, a mãe de todas as ciências, a filosofia. Sua primeira questão foi demonstrar racionalmente a existência de Deus e da Alma partindo da primeira e mais clara verdade: “ Cogito ergo sum!” (Penso logo existo).

Não estou capacitada a entrar no mérito dessas questões filosóficas já que corro o risco que estar muito equivocada, pois me garanto razoavelmente na Física, mas não na Filosofia. Então invoco meu direito á liberdade de expressão e de pensamento para expor, bastante superficialmente, os argumentos que Descartes usou para tratar racionalmente assuntos metafísicos, a priori questões de fé. (Se a lógica usada por ele não lhe parecer lá muito “lógica”, só digo que estou utilizando aqui palavras do próprio texto, ou seja, se no Discurso do Método ele diz que é “lógico”, então quem sou eu para contradizê-lo já que quero apenas informar sobre suas idéias e não discutir significados e validades).

Descartes pretendia desfazer-se do que aprendeu através da academia, negar tudo, desconstruir tudo, para que pudesse reerguer suas idéias e seu conhecimento sobre o mundo baseado apenas em verdades. Então concluiu que poderia negar absolutamente todos os aspectos da sua existência, por exemplo, todas as formas, os sentidos e os sentimentos podem simplesmente não existir. O corpo, as cidades, as florestas, a chuva, o sol, poderiam não existir, mas ainda sim haveria consciência no mundo, pois se não houvesse quem estaria pensando sobre essas coisas? Então para ele que tudo fosse uma farsa, uma ilusão, mas se há pensamento, a despeito de tudo aquilo que não existe, então há algum tipo de existência e, portanto, “Penso logo existo”. Para Descartes era essa uma verdade tão visceral e que era tão clara e óbvia que serviu de parâmetro para julgar a validade de todas as outras que ele poderia encontrar.
Naturalmente surge a demonstração da existência da alma. O que, afinal de contas, pensa e existe independente de toda e qualquer existência ou ilusão material? A alma, a verdade e a existência primeira.

A demonstração de existência de Deus ocupa um bom (e até confuso) espaço no Discurso do Método, vou descrevê-la sucintamente baseada naquilo que eu pude entender. Basicamente Descartes reconhece que, uma vez que buscamos conhecer as coisas do mundo é porque temos dúvidas. Poderia haver então só a dúvida? Sim, mas não é o que acontece, pois quando há dúvida buscamos naturalmente o conhecimento que irá aniquilar a dúvida. Por quê? Segundo Descartes nos parece que a dúvida é um aspecto imperfeito da nossa existência, uma mancha num quadro que queremos consertar. Uma vez que a única verdade até agora é a existência da alma, então esse impulso rumo à perfeição só poderia vir dela, mas baseados em que buscamos essa perfeição? Deve existir algo perfeito como parâmetro de comparação. O que é que conhecemos que é perfeito para nos fornecer essa idéia tão primitiva? Ou da própria consciência ou de alguma outra coisa, não pode simplesmente vir do nada. Se viesse da alma, entraríamos em contradição, pois se a consciência busca a perfeição é porque por si mesma ela não é perfeita, porque se fosse não haveria essa busca. Só nos resta assumir então que a perfeição vem “de alguma outra coisa”. “Coisa” é substituída melhor pela palavra “idéia”. A consciência busca a perfeição, pois conhecemos a priori algo perfeito e temos, então, um parâmetro de comparação. Descartes nesse momento invoca a palavra “Deus” para nomear a perfeição, o modelo, assim como se valeu da palavra “Alma” para designar aquilo que existe. Devemos ter em mente que Descartes era católico, educado com os jesuítas.

Basicamente esse é o tricô de idéias que permeia maior parte do “Discurso...”, posteriormente ele se dispõe a reconstruir o mundo baseado nessas duas verdades: a existência da alma e a existência de deus. Descartes publicou muito sobre suas conclusões a cerca do mundo físico, excursionou pelo funcionamento do coração e um monte de coisas, mas fala de maneira superficial sobre isso na obra em questão.

Confesso que para mim é muito difícil construir argumentos que sirvam de uma “crítica” á Descartes, sei que muitos dos “Doutos” possuem as suas, por exemplo quando falam que ele “pisou na bola” ao tentar tratar racionalmente assunto irracionais como deus e a alma. Não vou analisar o mérito das questões aqui, pois exige um nível argumentativo que foge a minha capacidade e ao meu conhecimento. O que fica para mim, e que eu gostaria que ficasse para você é a genialidade desse indivíduo que não se contentou com aquilo que estava estabelecido, que queria democratizar o conhecimento, o que sabemos, torna o indivíduo senhor das suas escolhas e não apenas massa de manobra. Além disso sistematizou o método que é utilizado em todas as áreas do conhecimento e inaugurou um outro momento histórico para a ciência. Sem dizer é claro da Geometria Analítica que permitiu que problemas que fogem a nossa capacidade imaginativa e gráfica de representação pudessem ser resolvidos algebricamente avançando assim o desenvolvimento das matemáticas.

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